Passei quase uma semana em Esalen,  um lugar  na costa da California em Big Sur,
tipo duas horas de San Francisco.  Me
inscrevi num programa individual de reflexão, ao contrario da maioria dos que
estavam la e  participavam em grupo de
workshops variados.  O único jeito de
poder se encontrar , quebrando, por um tempo, o estado de constante plantão em que
a rotina nos força, mesmo sem que nos demos conta, no local onde moramos, é
preciso se retirar. Por mais gregária e interdependente seja a especie humana,
cada pessoa, enquanto individuo,  deve se
tornar consciente da sua unicidade, pra poder ficar em paz consigo mesma.  Esses dias de silencio , solidão, e distancia
da internet,  quando eu só me comunicava com  o céu, as árvores,  o mar
ali abaixo do despenhadeiro rochoso, e a minha própria escrita, foram
maravilhosos pra mim. A sobremesa  foi o
passeio de carro pela costa, com meu filho Chris,  que se ofereceu me buscar. 
   Sempre amei o mar, `a beira do qual vivi
muitos anos no Rio. Em criança, levei muitos “caldos” das ondas; em
adolescente,  aderi, refrescando-me de
vez em quando no seu abraço azul, `a “religiao” de se queimar,  sob o sol tropical. Tornando-me mãe de Chris,
o oceano me deu a sublime missão de apresentar a inocência do seu poder,  ao poder da inocência de meu então pequeno
filho,  que se deleitava nas águas
salgadas. Mas em todos esses anos de convívio com o mar, nunca tive com ele a
relação, ou melhor, a comunhão que vivi, no passeio que mencionei.  Pra começar, a estrada que pegamos, e que
tinha sido fechada por vários dias, devido ao fogo que assolou diversas áreas
na California, fôra recentemente aberta, e só havia nós, sobre ela.  Em toda aquela imensidão, era como se
fossemos os primeiros a chegar num planeta de pura beleza, eu e ele parando
aqui e ali,  para apreciar, fora do carro,
os pontos mais dramáticos do encontro da fúria eufórica das ondas, espirrando sua branquidão nervosa nas pedras
angulosas de seu caminho, para novamente explodir contra a rocha íngreme da
costa. Quando havia extensão de areia entre o rochedo e as camadas de espuma
branca, esta era impiedosamente 
submersa,  pela corrida da massa
de água que, inexorável,  vinha investir
contra a encosta final.  Nem se tinha
acesso a algumas daquelas pequenas praias, que oferecendo-se sómente `a
contemplação,  deixavam o mar intocável e
inteiro, todo para si próprio.  Sagrado.  
   Morando na California há vários anos, Chris,
que tem sede de mar e de beleza, conhece bem o estado. Num dado momento, quando
novamente decidiu estacionar na estreita faixa de terra entre a pista e o
despenhadeiro, avistamos, alguns passos adiante, um grande e elevado assento,
feito de dois grossos troncos de árvore em estado bruto, a não ser pela superfície polida
em que se podia sentar.  Saindo do carro,
senti vertigem só de olhar, `a beira dos meus passos, na força do encontro  do  mar
la em baixo, puro e indomável,  com  a costa, um espetáculo cuja vista nos aparece
fatal; ponto máximo, quando a morte e a beleza 
se tornam parte da mesma revelação. 
A vertigem é temor e vontade
de perdão: aniquilação naquilo que nos ultrapassa.  
Quando Chris sugeriu que eu
me colocasse naquele assento, cujo alcance dependia de uma saliência num de seus lados, servindo como precário degrau para o alcance da superfície em que se podia sentar, perguntei-me se seria capaz. Uma vez
conseguindo, e tendo a grandeza do mar a
meus pés ao mesmo tempo que tão além do meu coração, senti-me no único trono verdadeiro de todo
este mundo. 
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